No dia 29 de janeiro de 2025, o Instituto Fazendo História realizou a décima terceira oficina presencial do Projeto Formação Profissional para o Trabalho com Jovens, com o apoio do FUMCAD (Fundo Municipal da Criança e do Adolescente), no Instituto Pólis. Com o tema "Trabalho em rede: construindo caminhos coletivos", o encontro foi direcionado aos profissionais que atuam nos Serviços de Acolhimento e também a outros atores da Rede Socioassistencial e do Sistema de Garantia de Direitos da Cidade de São Paulo. 

A oficina contou com a participação de Rosimeire Mantovan, assistente social e advogada, especialista em Direito Constitucional e em Gestão da Política Pública de Assistência Social, mestre em Serviço Social pelo Programa de Estudos Pós Graduados em Serviço Social da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e tem experiência profissional como gestora e pesquisadora na Política de Assistência Social e atuação em Assistência Judiciária, especialmente nas áreas de atenção à família, criança e adolescente. É sócia fundadora e consultora da Tecendo Social, docente de pós-graduação e docente habilitada do Programa de Educação Permanente da Política de Assistência Social – CapacitaSUAS do governo federal. 

Rosi inicia o encontro falando do grande desafio que é trabalhar em rede, primeiro porque há uma tendência a personificá-la e considerá-la como separada de nós, ao invés de compreender a rede como algo a ser construído a partir de uma dedicação coletiva e relacionada ao Sistema de Garantia de Direitos. Parte, então, de uma breve apresentação sobre esse sistema, quem o compõe, como se articula e sua perspectiva de proteção integral, fortalecendo o que é proposto no Estatuto da Criança e do Adolescente. Aborda seus 3 eixos estruturantes -promoção/proteção, defesa e controle- nos quais participam e se articulam diferentes atores da sociedade, como parte de um processo de construção e reconstrução permanente para garantia e operacionalização de direitos.

Em seguida, a convidada apresenta os principais conceitos, características e desafios vinculados à construção de uma rede, integrando a relatos de experiências de sua prática profissional. Dentre eles, ela enfatiza a importância de desenvolvimento de uma clareza acerca de qual a atribuição de cada área, possibilitando que cada uma assuma o seu papel, a partir de relações horizontais e de processos de responsabilização, e evitando que ocorra sobreposições e omissões que acarretem em desproteções. 

Ao trazer um histórico do campo da assistência social no Brasil, abrangendo a ausência do estado no papel de proteção, o que se dá de modo mais recente, aborda como, por muito tempo, coube à sociedade civil essa ação protetiva, partindo de um lugar assistencialista e de culpabilização das pessoas. E como, ainda hoje, persistem impasses e elementos que remetem a essa história de estigmatização de indivíduos e famílias com seus direitos violados. Ela chama a atenção para as complexidades dessas situações de desproteção, envolvendo ciclos repetitivos enfrentados por essas famílias e que vão se agravando, a partir de um processo de naturalização de violências, e que exigem intervenções estruturadas e qualificadas em rede.

A noção de intersetorialidade também aparece como um fator importante na estruturação de uma rede coesa, sendo compreendida como um instrumento estratégico de otimização de saberes, competências e relações sinérgicas em prol de um objetivo comum, transcendendo um único setor da política social e construindo saberes coletivos e múltiplos, a partir de uma visão integrada do território. Nessa perspectiva, Rosi expõe uma conceitualização de rede enquanto uma estrutura na qual seus integrantes se ligam horizontalmente, e não hierarquicamente, a todos os demais, e as decisões são tomadas coletivamente. Ou seja, uma malha de múltiplos fios, a qual precisa ir tecendo cuidadosamente e que pode se espalhar por muitos lados, sem que nenhum de seus nós seja considerado principal, cada qual com sua função e importância. Quando um nó se desfaz, falha-se a proteção e a responsabilidade é de todos. 

A convidada explicita como uma rede não pode se resumir a reuniões de discussão de casos, encaminhamentos ou a disponibilização de lista de endereços, se organizando como uma integração de políticas sociais, para elaborar e avaliar possibilidades, e que é sempre perpassada por relações de poder. Por conta disso, estar atento a tais relações e preparado para compatibilizar interesses e lidar com conflitos torna-se fundamental, contribuindo para a construção de uma rede mais democrática. A habilidade de dialogar, também com os atores com os quais se tem ruídos ou incompatibilidades, é essencial, garantindo suas características de interdependência e complementação entre áreas. Assim, caminha-se em direção a um trabalho contínuo, coordenado e aberto a intervenções ampliadas, que se dê de forma descentralizada e com participação social.

Em um segundo momento da oficina, Rosi propõe uma dinâmica na qual participantes voluntários, cada qual com uma bexiga e se apresentando como representante de uma área da rede de proteção, devem jogá-las para cima e cuidar, no coletivo, para que não caiam no chão. Após esse exercício, abre-se uma discussão, com participantes e observadores, acerca de como foi a experiência, seus desafios e o que fariam diferente, vinculando ao processo de formação de uma rede. Troca-se como, ao lançar-se na rede, o trabalho e a responsabilidade passam a ser de todos, a partir de um processo planejado, colaborativo e contínuo de proteção, no qual precisa-se cuidar para que nenhuma bexiga caia.

Na parte final, ocorre também um espaço de diálogo sobre os principais desafios e possibilidades que os participantes identificam no trabalho em rede em cada território. Uma questão que surge diz respeito ao lugar de isolamento de muitos serviços, autorizando-se a não se reconhecer como potência e não reconhecendo as potências dos outros atores dessa rede de proteção. O grupo é convocado a se perceber como parte dessa rede e a assumir um lugar ativo nela, participando, tensionando e se posicionando.

Confira o vídeo com a oficina completa: clique aqui