Assim que a pequena toupeira, animalzinho míope que tem sua toca debaixo da terra, acorda e espicha a cabeça para fora da terra, o fato acontece: um cocô, redondo, marrom e um pouco parecido com uma salsicha, cai bem em cima da cabeça dela. O acontecimento dispara a saga da toupeira que, em busca do autor do excremento, interroga os animais que encontra pelo caminho se os mesmos são os responsáveis pelo dejeto. Os bichos livram-se do interrogatório mostrando à pequena toupeira que seus cocôs têm características diferentes das apresentadas no montinho que está sobre a cabeça dela. Depois de conhecer tipos de cocôs variados, a pequena toupeira encontra duas especialistas em fezes, as moscas, que ajudam no desvendamento do mistério. Ao descobrir o responsável por tamanho atrevimento, vinga-se do culpado, o cachorro do açougueiro, fazendo um cocozinho preto e bem pequenininho que cai em cima do cocuruto dele, deixando-a feliz e satisfeita da vida.

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Sem dúvida, a ideia de refletir sobre a história Da pequena toupeira é impulsionada pelo interesse e encanto das crianças pelo livro. Muitas risadas são disparadas e caras de nojo ou de vergonha são estampadas no decorrer da trama.

As crianças manifestam enorme prazer em falar sobre cocô. As gargalhadas apontam que há, através da leitura e da brincadeira com as palavras, uma forma simbólica de trabalhar questões primitivas ligadas a prazeres infantis de relação com dejetos do próprio corpo. Os prazeres sentidos pelos pequeninos são transformados, à medida que eles crescem e se desenvolvem, sendo convertidos em nojo e vergonha.

O cocô é geralmente associado a algo sujo, feio e agressivo. É utilizado como arma de ataque em algumas situações como, por exemplo, por crianças que, após atingirem o treino completo, defecam em locais inapropriados para agredir os pais.

Quando pequena toupeira recebe um cocô na cabeça, logo percebe que há um ataque do exterior. O entendimento de que a agressão vem de fora possibilita a nomeação e delimitação da origem do dejeto e permite a vivência do ódio e da raiva. Usar a fantasia (imaginar, por exemplo, poder fazer um enorme cocô na cabeça do inimigo) como canal simbólico é fundamental para as crianças poderem revidar e se defender dos ataques.

Mahyra Costivelli, coordenadora do Grupo nÓs