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Basta abrir o jornal e não faltam notícias em que os personagens são “menores” que cometem “crimes”. Mas o que pouca gente percebe é que esses registros escondem outro problema: termos que deveriam ser usados apenas para adultos se tornaram corriqueiros para falar de adolescentes. Isso é reflexo da forma como meninos e meninas eram vistos até a década de 1990, quando o antigo Código de Menores previa punição para quem era considerado “delinquente” e não estabelecia os direitos básicos aos menores de idade. Ao mesmo tempo, crianças em situação de vulnerabilidade eram recolhidas em instituições que tinham um trabalho meramente assistencial, sem nenhum contato com a comunidade, visando “reformá-las” através de uma rígida disciplina.  Existia a ideia de que famílias pobres não tinham condições de cuidar de seus filhos, devendo, portanto, entregá-los aos cuidados do Estado. A maioria das crianças não era órfã, mas estava impossibilitada por algum motivo de conviver com suas famílias.

Atualmente isso mudou. A legislação brasileira estabelece uma diferença nítida entre adultos e crianças e adolescentes pois sabe-se que a infância e a adolescência são etapas fundamentais de formação em vários aspectos, inclusive de valores e práticas sociais. Nessa fase, o indivíduo deve ser amplamente protegido e precisa de cuidados especiais para se desenvolver. Direitos essenciais como saúde, educação, convívio familiar e proteção contra qualquer tipo de violência devem ser garantidos pelo Estado e pela sociedade. A falha dessa rede de proteção anda de mãos dadas com delitos cometidos por quem ainda não chegou à idade adulta. Daí a importância de garantir também o direito desses jovens mesmo quando estão em conflito com a lei.

Existe uma falsa impressão de que esses adolescentes não são responsabilizados pelo cometimento de ato infracional. Esses meninos e meninas são, sim, responsabilizados e isso ocorre a partir dos 12 anos de idade.Para eles, o Estatuto da criança e do Adolescente (ECA) prevê uma justiça especializada, já que pela Constituição são inimputáveis, ou seja, não podem ser julgados e condenados como adultos. O adolescente cumpre medidas socioeducativas – e não penas -, que têm por objetivo ajudar o jovem a repensar suas escolhas e seu projeto de vida através de um trabalho integrado entre profissionais, família e comunidade. Pelo ECA existem seis possíveis medidas socioeducativas: 1) advertência; 2) obrigação de reparar o dano; 3) prestação de serviços à comunidade (PSC); 4) liberdade assistida (LA); 5) inserção em regime de semiliberdade e 6) internação. Para que seja aplicada uma medida socioeducativa, é necessário considerar a capacidade do adolescente de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração.

Por isso a escolha das palavras corretas ao tratar desses casos faz toda a diferença. Ao optar por imputar uma infração – e não um crime - a um menor de idade, espera-se resgatar o potencial desse indivíduo em formação, garantindo uma oportunidade de trilhar outro caminho – sem impor rótulos difíceis de remover, perpetuando o ciclo de miséria e violência que a sociedade precisa romper.

COMO SE REFERIR?

Termos inadequados como "delinquente, criminoso, marginal" podem ser substituídos por apenas adolescente em conflito com a lei. Mas por que devemos priorizar o uso dessas expressões?

Esses termos trazem o problema para a pessoa, atribuindo seus atos a causas biológicas - difíceis de serem superadas. "Em conflito com a lei" estabelece uma condição temporal e superável.

OS NÚMEROS HOJE

Pesquisa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), divulgada em novembro de 2018, concluiu que há, no Brasil, cerca de 22.640 jovens privados de liberdade, internados em um dos 461 estabelecimentos socioeducativos existentes no país, acusados de terem praticado algum ato infracional. Destes, 3.921 são internos provisórios, ou seja 17% do total tiveram a liberdade privada sem uma sentença judicial definitiva.

No meio aberto, ou seja, que cumprem prestação de serviços à comunidade e/ou liberdade assistida, há 117.207 adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas.


Fonte: http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2018-11/brasil-tem-cerca-de-226-mil-jovens-privados-de-liberdade-diz-cnj

Colaborou Gabriela Cupani